terça-feira, 15 de janeiro de 2008

Recordações

Música, cor, confetis e muita alegria, é o que me vem à cabeça quando se fala em Coliseu Micaelense. Para além do recomeço dos amados e afamados bailes de Carnaval, o Coliseu é um espaço que me traz um historial de recordações muito maior, desde que me lembro. Chegava ao portão e entrava, com pezinhos de criança, muito devagarinho com medo da «Brigitte» - nome dado à cadela que lá vivia sustentada, pelos restos de comida do restaurante com o mesmo nome (Coliseu), e por uma ou outra alma caridosa que achasse que o pobre do animal, às vezes, tinha direito a uns ossinhos por bom comportamento ou apenas por existir e ser o que era. - E os filhotes da cadela quando vieram! Que alegria, que excitação olhar, junto com a minha «maninha», para o que mais parecia um conjunto de cães de peluche que se movimentavam a pilhas, de tão fofos que eram, todos pretos e castanhos.Depois subia as escadinhas de pedra para ir até aos escritórios, ver como estava ou fazer uma surpresa ao meu avô, que lá passava o dia no meio de papéis, bilhetes e cartazes cinematográficos, na sua grande sala iluminada com quatro amplas janelas. Era uma delícia poder sentar-me na (s) secretária vazia (s) (sim, pois os colegas iam-se com o tempo!) e fingir que trabalhava lá também! E a antiga máquina de escrever? Que encanto poder mexer-lhe, sem qualquer tipo de responsabilidade, apenas por que me apetecia!Corria todo o edifício, vasculhava cada um dos seus «segredos» e, muitas vezes, ao fim da tarde esperava-nos sempre um maravilhoso gelado caseiro, que se encontrava à venda na entrada do Coliseu. E tinha de ser de chocolate, o que era raro faltar! Tendo sorte na hora em que lá ia, ainda “apanhava” os ovos e o leite a serem postos na máquina, que depois transformava tudo aquilo em algo cremoso e de um sabor que, verdade seja dita, nunca mais encontrei igual. Era o sabor de ser criança!Mas ir atrás do palco era das partes mais divertidas. Até podia imaginar que estava a decorrer um espectáculo, com a particularidade de que teria, eu mesma, de interpretar os diversos personagens que me fossem surgindo nas ondas da imaginação. E os camarins, com todas aquelas luzes em volta do espelho, que faziam sentir a mais simples criatura na maior estrela do planeta. Dava gosto ali estar e imaginar estes cenários cheios de movimento e de ritmo!E a antiga cavalariça, ao lado do palco ( que actualmente serve de bar nos bailes) toda cheia de palha e com três ou quatro elefantes enormes, que passavam o tempo a comer ou a levantar a tromba e a fazer um barulhão, como se estivessem a dizer: “Estou aqui!”? O medo de me aproximar e o fascínio que estes animais exerciam sobre mim, quando não tinha ainda nem dez anos, faziam com que ali permanecesse, sem lhes tocar mas sem me ir embora. Depois, num ápice de coragem ou de medo esquecido lá lhes tocava com a ponta dos dedos e, eles quase nem se apercebiam, tal era o seu tamanho! Estava perante a Selva trazida para a cidade, não por muito tempo, mas pelo suficiente. Com alguma vegetação em volta destes «donos de marfim», diria agora que estava em África, em pleno Safari! E a pista, em que estado lastimoso ficava depois da actuação de todos esses animais na altura do Circo! Mas nada que não se resolvesse! Empregadas de limpeza, electricistas, enfim; já todos nos conheciam. “São as netas do «avô» “! E nos bailes? Chegávamos logo cedo, pois íamos com o avô! A nossa mesa, como lhe chamarei sempre nem que passem cem anos, na primeira geral já nos esperava. Era o tempo de nos instalarmos, de pormos os acepipes em cima da mesa saídos das cestas enfeitadas com tule vermelho e fitas e, íamos “explorar” o espaço, como da primeira vez se tratasse, ou para junto do querido avô, que tinha sempre um elogio para nos dar quando nos via vestidas a preceito para a ocasião. Dançávamos com ele, sentávamo-nos nos degraus da geral a apreciar o ambiente e, no fim, lá pelas 7 ou 8 da matina, havia chegado a hora de guardar os tupperwares, que estariam cheios de confetis se não fosse a cautelosa da minha avó a pôr-lhes sempre a tampa, evitando assim que comêssemos papel, para regressar a casa por vezes com os sapatos na mão, pois tinha sido uma noite em cheio.Voltando ao presente, ainda na semana passada aquando da homenagem a quem por direito, nas paredes deste Coliseu romano em Ponta Delgada, uma dessas pessoas que pensava já nem se lembrar de nós, veio cumprimentar-nos e fiquei feliz. No fundo, quem morre sempre cá fica, nem que seja na memória de quem o ama, alguém que, mesmo volvido muito tempo, não se esquece do que fazia, vivia e sentia junto dos que “injustamente” partem, para saudade dos que ficam com uma mágoa e com um vazio que nem o tempo pode preencher. Resta-nos aprender a viver, sem conviver com os que nunca mais esqueceremos e imaginá-los sempre perto de nós, nos momentos em que sabemos que estariam alegres e felizes, ainda sem se lembrarem que a morte não perdoa a ninguém e, imaginando que seria bom serem eternos e ficarem eternamente presos aos momentos em que puderam olhar-nos nos olhos e dizer: “O avô gosta muito de ti”. Desejava apenas ouvir essa frase para o resto da vida.

Raquel Moreira
Public, "Correio dos Açores", 2005.

Dia de São Valentim O Dia do Amor

Peluches, corações, cartões com dedicatórias românticas. Enfim, todo um cenário vermelho e branco acompanha este dia. Quem não sabe que, na Europa e na América do Norte, comemoramos hoje, 14 de Fevereiro, o Dia de São Valentim ou Dia dos Namorados? Não se admire, pois no Brasil a festa tem lugar a 12 de Junho.Um dia de afectos e carinhos e juras de amor eterno, onde os abraços e beijos (inhos) tomam a dianteira e, cujas origens são já bem antigas.
Abraços, trocas de olhares, presentes, palavras «doces» e muito mais, é o prato do dia dos casalinhos de namorados, casados ou não, nesta data de amor. Não importa a idade e esquecem-se as zangas, porque no Dia de São Valentim apenas interessa comemorar o facto de duas pessoas se amarem e partilharem o caminho da vida. Muitas vezes, um ramo de flores ou uma caixinha de Bombons é o suficiente para fazer o coração da amada disparar como uma bomba, ao que se segue aquele brilho nos olhos, que já todos conhecemos e que parece dizer:” Estou tão feliz por te lembrares” ou “ Sou muito feliz por estares comigo”.
Resta perguntar como surgiu este Dia e porquê. As versões são várias sobre as origens do Dia dos Namorados ou Dia de São Valentim. Para uns, a data surgiu na Roma antiga, por alturas das festas pagãs de Lupercália, dedicadas a Lupercus (protector de rebanhos e pastores) e à Deusa do Amor, Juno de seu nome. Introduzidas em 496 na tradição cristã em 496 e, comemoradas a 14 de Fevereiro, estas festividades eram celebradas em memória de São Valentim, padre romano que foi executado em 270.No séc. III, na cidade de Terni, a 75 quilómetros de Roma, o Imperador Claudius II (268 – 270) proibiu todos os noivados e casamentos em Roma. Segundo Claudius II, havia falta de homens no exército, porque os jovens rapazes não pretendiam afastar-se das suas noivas, esposas, namoradas e amantes. Mas Valentim, na altura bispo de Terni, contrariando este decreto continuou a casar os jovens apaixonados em segredo, o que fez com que fosse preso, torturado e, decapitado a 14 de Fevereiro de 270. A sua ascensão a Santo da Igreja Católica deve-se à sua abnegação em prol da fé e do amor, pelo Papa Gelasius, passando o dia da sua morte a estar ligado aos apaixonados. E foi este mesmo Papa, Gelasius, quem declarou o dia 14 de Fevereiro como Dia de São Valentim, em 498 A.C.
Outra versão defende também a existência de um São Valentim que, em meados do século II D.C., se recusou a abdicar da fé cristã que professava, tendo por isso sido preso pelos romanos e, segundo consta, as crianças escreviam missivas de amor que depois lhe atiravam pela janela da cela.Em França até existe, no centro de Champagne Berrichonne (departamento de l'Indre), uma localidade chamada Saint-Valentin.Ainda uma terceira versão de carácter um pouco duvidoso, relata que São Valentim teria deixado um bilhete de despedida à filha do seu carcereiro, de quem tinha ficado amigo, e cujo título era "Do teu Valentim". Esta é considerada a única explicação plausível, dos habituais postais com que os casais apaixonados são presenteados nesta altura do ano.A tradição da troca de presentes surgiu, em 1840, quando Esther A. Howland resolveu iniciar uma produção em massa de lembranças, para comemorar o “Valentine's Day”, como era conhecido nos Estados Unidos. A ideia depressa se espalhou pelo mundo, e ainda mais com o apoio dos comerciantes, que não deixaram de ver este dia como uma boa oportunidade de negócio.Existem diferentes formas de celebrar esta data. Na Itália é habitual fazerem um banquete e para celebrarem o amor e a amizade. Em Inglaterra, os pais dão doces as crianças e a tradição manda, que se beije seis pessoas antes da meia-noite, para obtenção de felicidade na vida amorosa. Na Dinamarca o presente mais famoso são as flores prensadas, designadas por flocos de neve.Em Portugal, as ofertas são variadas, desde chocolates e flores a cartões e peluches.Mas o objectivo é mostrar o quanto gostamos de alguém, o que sentimos e, sobretudo, fazer com que essa pessoa se sinta especial. Os pássaros, por exemplo, passaram a ter um significado muito próprio neste dia, podendo o facto de avistar um ou outro pássaro ser determinante na vida sentimental da pessoa. Ver um "pintarroxo" era sinal de casamento com um marinheiro; um pardal era sinal de ele era pobre, mas seriam felizes; uma andorinha simbolizava um bom homem e; se a mulher avistasse um pica-pau no dia de São Valentim, era sinal de que ficaria solteira.
Sabemos que, no século XV, Charles, o jovem duque de Orleães, foi um dos primeiros a utilizar o conceito dos cartões de São Valentim. Aprisionado na Torre de Londres, depois da batalha de Agincourt em 1415, terá enviado, no Dia de São Valentim, vários poemas e bilhetes de amor à esposa, que se encontrava em França. Também vindo do século XV foi provada a existência de um cartão de São Valentim, com a imagem de um Cavaleiro e de uma Dama, acompanhados por Cupido de arco e flecha.Também Santo António tem fama de casamenteiro e dos namorados. 13 de Junho foi a data escolhida para homenageá-lo, chegando algumas paróquias a fazer uma distribuição de pãezinhos bentos, como garantia de abundância de alimento para o resto do ano.Ansiando por encontrar a sua cara-metade as jovens acendiam velas, colocavam a imagem do santo de cabeça para baixo atrás da porta e enterravam-na até o pescoço. Até se acreditava, que comer um pouco do bolo oferecido ao padroeiro podia trazer casamento. As que conseguissem um parceiro através de Santo António prometiam voltar e casar na igreja.Santo António, nasceu em Portugal e viveu na Itália do século XII, tendo ganho fama de casamenteiro, depois de ter sido procurado por uma jovem rapariga. Esta encontrava-se desesperada, porque o pai estava doente e os recursos económicos de que dispunham eram escassos. Pensando ser a única solução possível, a jovem decidiu prostituir-se e, Santo António arranjou-lhe um marido, segundo a lenda, bonito e rico. O facto é que, cem anos mais tarde, Santo António foi canonizado pela Igreja Católica e a sua fama de casamenteiro mantém-se até hoje. Ao contrário da versão portuguesa do dia de São Valentim, em muitos países da Europa é comum as pessoas presentearem não somente os namorados(as), mas aqueles de quem gostam, como mães, pais, irmãos, amigos.No Japão, a data foi introduzida em 1936 e, segundo a tradição, as mulheres presenteiam os amados com caixas de chocolates.Na Inglaterra, o Dia de São Valentim passou a feriado por volta do século XVII. Nos Estados Unidos, o feriado foi fixado no calendário em 1700.Actualmente, a Igreja de Santa Praxedes, em Roma, guarda as relíquias do santo e é um destino de romaria de muitos pares de namorados.As opiniões são unânimes.
O Dia de São Valentim é uma data “muito especial” e que não se esquece. Em termos de presentes, as opções são variadas. Desde peluches a perfumes ou «boxers». Jantar fora, ir ao cinema ou simplesmente passear parecem ser os desejos dos namorados da actualidade. Falando em ideais, talvez uma viagem às Caraíbas ou à Índia fosse sensacional.
Quanto ao que é necessário para que um relacionamento seja firme e duradouro, a palavra “confiança” é a mais utilizada, logo seguida da “compreensão, carinho e respeito”. Mas o mais importante para os jovens casais é, realmente, estarem sempre juntos e terem a companhia um do outro.
Para João Paiva, o Dia de São Valentim é dedicado aos casais, que devem comemorar esta data convenientemente e saber “qual a razão do amor”. O jovem afirma ainda que, normalmente, costuma lembrar-se do dia, que é passado junto com a namorada. “Vamos ao cinema ou só passear, mas o mais importante é estar com ela”.Este ano, diz que os planos ainda não estão definidos, mas confessa adorar oferecer um “peluche” e, em troca receber ... “uns beijos!...”- admite.Quanto ao Dia de São Valentim de que mais gostou até agora, depois de afirmar não saber qual foi, o jovem afirma que foi “há dois anos, com uma pessoa que me «marcou»”. Isto, apesar de não terem feito nada de especial, apenas “passámos o dia juntos”.Mas o ideal para João Paiva, seria mesmo “fazer um cruzeiro às Caraíbas ou ir à Holanda”.
Tânia Botelho define a data como sendo, um dia “especial na relação”, que nunca esquece e, em que todos estão um pouco mais “sentimentais”.Um dia ideal seria estar com o namorado e “viajar até à Índia”. O dia de São Valentim de que mais gostou foi precisamente há “três anos”. Lembra que esteve com o namorado e foram almoçar como fazem habitualmente. Mas, além disso, aconteceram algumas coisas “originais, que nunca tinham acontecido antes”. “Ele dedicou-me uma música e cantou em Karaoke para mim e ofereceu-me um peluche e uma rosa”- acrescenta. Quanto a presentes preferidos, confessa que “depende da pessoa”.Este ano, Tânia Botelho diz ainda não saber como vai passar o dia, mas admite que “o que interessa é estarmos juntos”.
Para Raquel Arruda, o Dia dos Namorados tem “muito” significado e é uma data de que nunca se esquece. “Normalmente, saímos e vamos ao cinema, mas este ano ainda não sei”- explica, admitindo que o que mais gosta de oferecer são “boxers”. Em contrapartida, adora receber “peluches”.Avança ainda que, 14 de Fevereiro de 2004 foi o dia de São Valentim de que mais gostou. “Foi especial para mim, porque adorei estar com ele no cinema e!...- é o ideal”.Na opinião de Raquel Arruda, “confiança” é o segredo para um relacionamento estável.
Segundo Cláudia Rodrigues trata-se de um dia “muito especial” e que nunca lhe passa ao lado. O programa é geralmente “passear”, mas este ano ainda não há projectos. Confessa gostar muito de oferecer “boxers” e de receber peluches. Afirma que “todos os anos é bom”, mas adorava ir até ao “Algarve”. Além da confiança, aponta o amor como “chaves” para o sucesso de uma relação.
Márcio Tavares ficou um pouco envergonhado e não quis responder às nossas questões.
Renato Marrucho afirma lembrar-se sempre deste dia, que costuma passar indo ao cinema. Este ano ainda não tem planos, a não ser, talvez, oferecer um “soutien” à namorada e receber os famosos “boxers”. O ideal seria viajar até às Caraíbas.“Confiança, amor e respeito” são o segredo deste jovem, para que tudo resulte às mil maravilhas.
Segundo Beatriz Andrade 14 de Fevereiro é um dia “especial de que me lembro sempre”. É a “primeira vez” que comemora este dia, mas ainda não sabe como irá passá-lo. Ainda não sabe o que vai oferecer, mas um “peluche ou um perfume” seriam as prendas que gostaria de receber.Ir aos “Estados Unidos” seria espectacular.“Confiança, compreensão e carinho penso ser o essencial”- acrescenta.
Delço Miranda diz ser um dia especial, que não esquece.“Ainda não sei o que vou fazer este ano, mas costumo passear, ir à praia ou ao cinema”- relembra, avançando que adora oferecer e receber “peluches e perfumes”. Afirma ainda não ter comemorado esta data muitas vezes, o que o leva a não saber muito bem o que seria um Dia de Namorados a cem por cento. Quanto ao que é preciso para que um relacionamento seja firme, o jovem aponta a “confiança”, como o essencial.
Raquel Moreira
Public, "Correio dos Açores", 2005.

VOCÊ BATE NA MADEIRA!

Atira sal por cima do ombro, bate na madeira, levanta-se da cama com o pé direito? diz “isola”, quando lhe contam algo de mal que aconteceu a outra pessoa?Tudo isto, são superstições. Há quem acredite, há quem não acredite. A verdade é que as superstições existem e, mais ou menos, fazem sempre parte do nosso dia-a-dia. Mas, o que são superstições, de onde vêm?
O QUE SÃO SUPERSTIÇÕES
O termo vem do latim superstitio, que significa “ o excesso” ou “o que resta e sobrevive de épocas passadas”. Designa, em qualquer dos casos, “o que é alheio à actualidade, o que é velho”. Na linguagem religiosa dos romanos, trata-se da observância de cultos arcaicos e populares, que não correspondem às normas da religião oficial. São milhares de gestos, reservas e actos instintivos, subjugados ao hábito, como os gestos reflexos.As superstições são parte da essência intelectual humana e estão sempre presentes na história do mundo. O aumento do padrão de vida, o domínio da máquina, etc; tudo tem o seu cunho, o seu corpo supersticioso. Quem o nega é, porque nunca assistiu à confidência reveladora. Segundo o Visconde de Santo Tirso, em 1923, “ Era supersticioso Napoleão (…) e Bismark. É livre de toda a superstição qualquer jumento, o que prova que a libertação do espírito não é incompatível com o comprimento das orelhas.” Estas são usadas como defesa, com vista a evitar males maiores, sendo os seussinais exteriores os amuletos ( dos quais falaremos mais adiante neste estudo), como adornos, jóias, etc. Este mecanismo de defesa vai até às partes mais profundas do raciocínio humano, agindo independentemente, das suas acções. Trata-se de uma questão de sobrevivência, o homem tenta explicar o que não entende. A superstições são, como os pecados. Podem dar-se através de pensamentos, palavras e acções. Fazer três pedidos ao ver uma estrela cadente, dizer “isola” ou levantar da cama com o pé direito. As superstições têm também um carácter ambivalente. Sim, porque tanto podemos estar a defendermo-nos, como até podemos projectar o mal à outra pessoa, por meio de rezas, amuletos, etc. Não se deve confundir superstição com crendice. Acreditar em bruxas, fantasmas não é superstição. Ser supersticioso consiste, em atribuir a algo, poderes maléficos ou benéficos.ESCADASEsta é uma superstição difundida, principalmente, no litoral brasileiro. “ Joaquim Nabuco não era supersticioso, mas não passava debaixo de uma escada”.Ora, a escada representa subida, elevação. Logo, quem passe por baixo de quem sobe, está a renunciar, por isso perde a sorte. Na Espanha, para além disso, as mulheres que passem debaixo de uma escada não casarão e terão má sorte.GATOSDizem as superstições que o gato, como é dos animais mais resistentes e com os reflexos mais rápidos tem sete fôlegos / vidas. Assim, quem matar um gato terá sete anos de azar. A título de curiosidade, há animais, principalmente cães e gatos, que são torturados pelo Homem. Para muitos, a explicação está nos costumes bárbaros da Antiguidade e da Idade Média, nas quais quando as mulheres eram condenadas à fogueira, classificadas de feiticeiras, os respectivos animais sofriam também este triste destino. Infelizmente, em muitos aspectos, a humanidade ainda não evoluiu, existindo ainda hoje, pessoas que cometem estas heresias com estes pobres animais indefesos. Há quem diga até, que quem pisar a cauda de um gato, não casa naquele ano.No Egipto havia o gato “mascotte” , “porte-bonheur (portador de felicidade ), entidade sagrada, protectora e símbolo do calor do sol. Seguindo esta história, resta-nos a proibição de matar o gato e admiti-lo como fonte de boa sorte. O gato preto dá sorte, quem diz o contrário revela puro preconceito. Ele é sinal de felicidade, embora o diabo, às vezes, tomasse esta forma. Em alguns países, as esposas de pescadores mantinham os animais em casa, para evitar desastres no mar. Se um funeral cruzasse com um gato, era sinal que morreria outro membro da família.Vejamos a nível mundial, como é visto este animal:
EUA
Se o animal se sentar com as patas traseiras voltadas para a fogueira, o dono terá um resfriado. Os primeiros colonos americanos acreditavam, que a sopa de gato preto curava a tuberculose. Mas, ninguém se arriscava a fazê-la !
ESCÓCIA
Parabéns ! Se aparecer um gato preto aparecer à entrada de uma casa é sinal de prosperidade.
IRLANDA
Se um gato preto cruzar o seu caminho em noite de lua cheia, significa que estão a caminho mortes por epidemia.
BRASIL
Cuidado com os gatos ciumentos, perto de crianças !
INGLATERRA
Se o gato tem riscas dá azar.Se o gato lavar a parte de trás das orelhas, vai chover.Charles I, tinha um gato preto que lhe trazia sorte. O monarca acreditava piamente nisso, que tremia só de pensar em perdê-lo. Por isso, guardava-o dia e noite. Aquando da sua morte, o rei foi preso pela oposição.
ESCANDINÁVIA
Um gato apoiado nas patas traseiras é sinal de fertilidade.
ITÁLIA
Quando um gato espirra é um bom presságio, para quem ouve.Um gato preto estendido na cama de alguém, seria sinal de morte para o dono da cama.
FRANÇA
Não se deve atravessar um rio transportando um gato.
NORMANDIA
Se vir um gato com pelagem escama-de-tartaruga, tenha cuidado. Pode haver uma morte por acidente.ISLÂNDIANo natal, deve-se vestir ao menos uma peça nova de roupa. Caso contrário, o Gato pega a pessoa.
ÍNDIA
Gato em pé, é sinal que a dona terá um filho em breve.
CHINA E JAPÃO
Crê-se, que os gatos evitam feitiços e bruxarias. Além disso, aparecendo um bichano desconhecido a sorte vai mudar.TAILÂNDIAAcreditava-se, que a alma dos mortos vivia no corpo de gatos sagrados antes de partir para a próxima vida.
GRÃ BRETANHA
Os gatos pretos trazem sorte.
YORKSHIRE
O gato preto representa sorte para o seu dono, mas dão azar a quem os encontre por acidente.
OBJECTOS
São vários os objectos vistos como possuidores de poderes maléficos ou benéficos,tais como, ferraduras, cabeças d’ alho, fitinhas, pulseiras, arruda, sal grosso, óleo, flores, copos de água, duendes, pedras, cristais, pirâmides, etc. Estes fazem parte do quotidiano das pessoas, que os têm por acreditarem nos seus poderes de cura, de afastar “mau-olhado”, trazer sorte, entre outras.Além disso, nas igrejas temos também objectos, desta vez, ligados à fé; aos quais são atribuídos poderes espirituais. Por exemplo, medalhas, crucifixos, terços, imagens de santos.
FERRADURA
Nunca ouviu, que dá sorte ter uma ferradura, por cima da porta de entrada da casa, do lado de dentro ? Esta é uma superstição cigana, povo para quem a ferradura representa esforço e trabalho. Esta é vista, como um poderoso talismã, que atrai a boa sorte, a fortuna e afasta o azar.Seja gato, seja cão. Seja preto, seja branco. O melhor é tratá-los bem, a todos. No fim, das contas… O diabo tece-as.

Raquel Moreira
Public "Correio dos Açores", 2004.

"Amargas experiências de Vida"

A maioria de nós vai, certamente, passar o Natal em casa junto da família. Mas, infelizmente, há quem, por um motivo ou outro, o faça no Estabelecimento Prisional Regional de Ponta Delgada, longe dos amigos e de quem o viu nascer.
Flávio Costa encontra-se detido desde há cinco anos e meio. O jovem de 28 anos diz ser difícil e estranho estar preso e o mais difícil de tudo é precisamente o não poder estar com a família. Mas, este será o último Natal que terá de passar longe daqueles de quem gosta, pois a sua pena termina no dia 30 deste mês. “Uma lição de cinco anos e meio é muito pesada”, afirmou.
Avelino Carreiro está detido há treze meses e enfrenta uma pena de oito anos. Este restaurador levou a cabo uma pesquisa de dois anos, – que terminou em Agosto – onde investiga a origem das carroças nos Açores. Tema que servirá de pano de fundo para uma exposição a realizar no início do próximo ano. Avelino Carreiro deu-se ainda ao trabalho de construir cada uma das carroças que estudou, tendo também como objectivo publicar um livro com toda esta história.O próximo projecto é escrever a sua biografia, afirmando que será um livro “muito interessante”.
O Estabelecimento Prisional de Ponta Delgada tem sob a sua alçada um total de cerca de 180 reclusos. Quase duzentas pessoas que vão ter um Natal diferente, longe de casa e dos familiares, apartados das suas raízes. Os erros são muitos e a verdade é que ninguém é perfeito. O que varia é o preço que cada um tem de pagar pelas falhas que comete.“Na primeira semana as lágrimas correm”.
Flávio Costa foi preso por assalto, aos 23 anos, tendo recebido uma pena de cinco anos e meio. O Natal, afirma, será igual ao dos anos anteriores. “Teremos o jantar e será celebrada uma Eucaristia para todos”, relata, lamentando ainda não poder festejar a quadra em casa junto da família.Apesar de saber que sai da prisão no dia 30 deste mês, Flávio explica ainda que “a ansiedade é tanta que conto os dias e, muitas vezes, tenho de tomar comprimidos, pois não consigo dormir”.Quanto a estar preso, conta ser difícil, principalmente o estar longe da família, mas quando esta o visita, afirma ser muito agradável, pois “convivemos um pouco”. “É muito difícil e estranho estar preso. Na primeira semana, é complicado, as lágrimas correm”- desabafa.Não há pais, nem amigos e temos de aprender a viver longe de todos”. Diz ser um mundo “completamente diferente”, avançando ainda que sente mais falta de ”estar com a família toda unida”. Isto, apesar de ter, às vezes, a possibilidade de ir a casa por uns dias através do Tribunal (“a precária”) ou da cadeia (“RAVI Regime Aberto Voltado para o Interior e o RAVÉ, Voltado para o Exterior, aplicado a quem já esteja a meio da pena”). Desde que entrou na prisão, já tirou dois cursos de Informática e recebeu agora também o certificado de Carpintaria, para aproveitar o tempo. No início, conta que se portava mal, tendo chegado mesmo a fugir. “Fiquei escondido durante dois dias e fui apanhado”.Referindo-se ao crime que cometeu, o recluso afirma que “o diabo leva as pessoas para maus caminhos. Fiz algo que nunca me tinha passado pela cabeça”. tendo depois ficado com “raiva” de si mesmo. Flávio desabafa ainda que quando foi detido, “não tinha noção do que era a vida e das responsabilidades que a mesma acarreta”, afirmando mesmo: “não olhava por mim”.O recluso acrescentou que se pudesse voltar atrás, não tinha feito nada daquilo, pois nem tinha necessidade de o fazer. “Uma lição de cinco anos e meio é muito pesada”- sublinha. A data da sua saída aproxima-se a passos largos, o que Flávio Costa define, aos 28 anos, como “um grande peso que me vai sair de cima”.Referindo-se ao mundo, afirma que “tudo mudou”, adiantando que é muito diferente das pessoas da sua idade, que não viveram esta experiência.“Consegui mudar e aprendi a dizer não”- concluiu, sem se esquecer de enviar um Bom Natal a todos.“É difícil estar longe da família”.
Avelino Carreiro, restaurador de profissão, está preso há 30 meses com uma pena de 8 anos, por posse de 23 gramas de droga. O recluso afirma ser “difícil estar longe da família”, avançando que o pior com que tem de lidar na prisão, são “os jovens que ainda estão naquela fase de revolta por terem vindo para cá e, por isso, roubam e provocam discussões”. De momento, conta estar a tirar um curso de Informática e foi, já há algum tempo, nomeado “representante do 1º Piso”, uma espécie de porta-voz dos reclusos, no caso de haver questões a resolver.Mas, o mais interessante na sua história é que levou dois anos a pesquisar sobre as primeiras carroças, nos Açores, que remontam a 1428 e que “no início não eram puxadas por animais, mas pelos próprios donos”. Referindo-se à sua experiência pessoal, conta que “aos oito anos já puxava a carroça, pois o meu pai morreu novo e eu tive de deixar de estudar e começar a trabalhar. Aliás, só fiz a quarta classe depois de adulto”.A pesquisa terminou em Agosto deste ano e será tema de uma exposição, a realizar em Janeiro. A ideia surgiu ao constatar que não haviam documentos sobre o assunto, “nem na Biblioteca Pública”. “Eu e a minha mulher - a pessoa de quem mais sinto falta cá dentro e que, duas horas antes da visita, já cá costuma estar para me ver - íamos pelas freguesias fazer perguntas sobre os vários tipos de carroças existentes”- acentua.Para além de construir ele mesmo todas as 38 carroças que investigou, Avelino Carreiro vai ainda publicar um livro, provavelmente em Fevereiro com a história de todas elas, “para que a juventude saiba como se vivia há algum tempo atrás”. Carroças estas, que serão em breve, postais.Falando em projectos, o restaurador de 60 anos pensa ainda escrever a sua biografia, pois afirma ter tido uma vida “atordoada”, o que a torna uma obra “muito interessante”.

Raquel Moreira
Public no "Correio dos Açores" em Dezembro de 2004.

Teatro Micaelense: de Convento a Centro de Congressos

O Teatro Micaelense reabre a 5 de Setembro como Centro Cultural e de Congressos, após obras de remodelação orçadas em 8 milhões de euros. A inauguração, propriamente dita, terá lugar a 17 de Setembro com a actuação do cantor lírico espanhol José Carreras.O edifício que funcionou como sala de cinema da maior cidade açoriana durante décadas, passará a anfitrião de congressos, reuniões, exposições e espectáculos de teatro e ópera, após ter estado em obras desde Agosto de 2003.A sala de congressos dispõe de 830 lugares (também adaptados para deficientes motores), sala de ópera e teatro. Haverá ainda espaço para exposições, reuniões e áreas específicas para tradução simultânea, régie, bar e camarins.O objectivo do projecto encomendado pelo governo açoriano e desenhado pelo arquitecto Rodrigues Lima - responsável também pelo Monumental em Lisboa – era o de manter as características arquitectónicas do edifício.
FUTUROS PROJECTOS PARA O CENTRO DE CONGRESSOS
Em Setembro do próximo ano a cidade de Ponta Delgada acolhe, pela primeira vez em Portugal, o Congresso Internacional de Genética Forense. O evento tem a duração de seis dias (entre 12 e 17 de Setembro) e contará com a presença dos maiores especialistas e investigadores mundiais na área. Esperam-se à volta de oitocentos participantes no antigo Teatro Micaelense.“A atribuição da organização a Portugal é o reconhecimento internacional pleno do elevado nível científico da genética forense portuguesa, pois havia outros países interessados” disse o presidente do Instituto Nacional de Medicina Legal (INML), entidade encarregue da organização em acção conjunta com o Instituto de Patologia e Imunologia Molecular da Universidade do Porto (IPATIMUP).No parecer de Duarte Nuno Vieira, trata-se do congresso mais importante e de maior prestígio científico, no qual alguma vez já participou o INML com excepção do Congresso Mediterrânico de Genética Forense.Pela primeira vez, será feita abordagem à genética aplicada à patologia forense. O sindroma da morte súbita poderá também ser explicado, através do estudo dos marcadores genéticos. Para além destes, temos ainda temas “tradicionais” como a investigação da paternidade, criminalística, o cromossoma Y, mutações pontuais, genética de populações, ADN mitocondrial entre outros.Este é um dos vários eventos que terão lugar no novo Centro de Congressos de Ponta Delgada.Há já muito tempo que a cidade estava a precisar de um espaço desta natureza. Resta-nos apreciá-lo e dar-lhe o devido valor. Espectáculos, ópera, bailados, exposições; são muitas as hipóteses.A cultura veio para ficar.
O PRIMEIRO TEATRO MICAELENSE
A 28 de Dezembro de 1856, a Sociedade dos Amigos das Letras e Artes aprovou a proposta de edificação do Teatro Micaelense na área das ruínas da Igreja de S. José. Na primeira reunião de accionistas em 1859, segundo Francisco Maria Supico, em as “Escavações”, alguns cidadãos de Ponta Delgada apresentaram então a “ideia grandiosa e altamente civilizadora” da construção do teatro. Ainda no mesmo ano, chega de Lisboa o plano para o grande teatro de Ponta Delgada, sendo também aprovados os estatutos da sociedade gestora do mesmo. Dois anos mais tarde, tem início a demolição das referidas ruínas, terminando as obras a 30 Março de 1864. A 2 de Junho é dado um concerto no salão.Curiosamente, segundo Francisco Maria Supico, Ponta Delgada foi a primeira terra portuguesa em que se cantou ópera com LIBRETTO português, por vozes locais e composta na cidade para na mesma se representar a “Hayde”.Depois, este passou a ser onde é hoje o jardim Sena Freitas. Mas, após um grande incêndio em 1929, o edifício ficou em ruínas. Veio a crise bancária, seguida da dissolução da “Sociedade do Teatro Micaelense” e surgiu, então o referido jardim.No verão de 1946, Ponta Delgada recebeu a visita de Santos Costa, Ministro de Guerra. Desde uma reunião da Câmara Municipal realizada a 11 de Fevereiro, que circulava já a ideia de pedir autorização para construir um novo teatro no antigo Convento de S. João – utilizado como quartel durante a 2ª Guerra Mundial. Assim, depois da passeio do Ministro pela cidade, o Governador, Aniceto dos Santos aproveitou a ocasião para fazer o pedido a Santos Costa. O antigo edifício teria de ser demolido, para dar lugar à nova estrutura. Perante as razões que lhe foram apresentadas, o Ministro de Guerra propôs-se logo a tratar da transferência daquele serviço militar para o antigo Hospital Militar dos Arrifes e da respectiva cedência do edifício, propriedade do Ministério de Guerra. Libertos o terreno e o edifício, o referido Ministro entregou-os à Câmara Municipal, que por sua vez cedeu-os à “Sociedade Teatro Micaelense”, que se havia erguido novamente e deu início às obras. Também de realçar na actividade de construção do Teatro Micaelense, foi a preciosa colaboração dos “Carregadores Açorianos”, que sugeriram a construção de um novo Teatro na cidade. Nomeadamente, de Luís Tavares, Director-Delegado.Quatro anos depois, o teatro abre as portas ao público. Um elemento de valor na vida cultural da cidade e que, testemunharia às gerações vindouras a época de prosperidade que se vivia e o espírito de iniciativa das entidades particulares já mencionadas, apoiadas pelos poderes públicos.
INAUGURAÇÃO DO TEATRO MICAELENSE
A 31 de Março de 1951, a partir das 20 horas, quem estivesse no Largo de S. João podia calmamente observar várias filas de carros vindas de todas as direcções, para assistir à inauguração do Teatro Micaelense. O programa incluiu para além da sessão solene, um espectáculo, baile e outras homenagens.Subiu o pano! No palco estavam o Conselho de Administração dos Carregadores Açorianos, o Conselho Fiscal, um Delegado do Governo, a Direcção da “Sociedade Teatro Micaelense” e empregados da companhia armadora. Seguiram-se os discursos do Director-Delegado Francisco Luís Tavares e do Governador Civil Ângelo Casimiro.Curiosamente, até o Senador Herbert H. Lehman, antigo Governador do Estado de Nova Iorque e grande figura política norte-americana, tendo conhecimento da inauguração do Teatro Micaelense telegrafou a José Bensaúde, congratulando-se pelo evento.
O HOMEM DO TEATRO
Quando se fala do Teatro Micaelense, torna-se quase impossível deixar de mencionar o nome de Santos Figueira (nasceu a 14-9-1922 e faleceu a 19-12-2003).António dos Santos Figueira foi durante toda a segunda metade do século XX, um dos mais conhecidos promotores de teatro e cinema em S. Miguel. Responsável na ilha pela empresa proprietária do Teatro Micaelense, foi figura de destaque em todos os espectáculos ali realizados, definindo também os filmes a exibir. Junto com Teófilo Frazão e Victor Cruz, organizava ainda os conhecidos e afamados Bailes do Coliseu, por alturas do Carnaval.O advogado Melo Bento descreve-o brevemente aos microfones da Antena 1, como um “Homem que colocava um entusiasmo incrível em tudo o que fazia. Trazia o que havia de melhor para S. Miguel, com um calendário de filmes que encantaram a minha geração, mas também espectáculos de teatro, aplicando valores e ordem em tudo o que promovia”.
Raquel Moreira
Public, "Correio dos Açores", 2004.


TABACO:Quem não fuma DETESTA!!

Estou à mesa ! É a primeira vez que cá venho. A comida até é boa, os empregados são educados. Só é pena que, a mesa do lado tenha decidido atirar com o fumo dos cigarros para cima de mim, aliás de todo o restaurante ! É coisa que detesto, estar a comer e respirar fumo por todos os lados. Tudo bem, quem fuma gosta. Mas, QUEM NÃO FUMA DETESTA! Ninguém se lembra disto ? É preciso ser egoísta! Só pensam no seu bem-estar. Até já estou a imaginar as conversas entre os convivas da dita mesa “ Epá este cigarrinho depois de comer calhou mesmo bem!” Então, se eu for fazer o que me “calha bem”, chamo o empregado e digo que o fumo está-me a incomodar e os “gentis senhores” da mesa ao lado retiram-se. Ou, logicamente, extinguem os cigarros... – Diga-se de passagem, que a lei está do meu lado! - Mas isso já é mais complicado. Sim, porque pelo que vejo quem fuma venera o seu cigarrinho. Experimente pedir a um(a) namorado(a) para deixar de fumar ! AI, AI !! Não me posso rir mais! Que dores de barriga! Se está à espera que isso aconteça é melhor estar sentado, e bem !... Na melhor das hipóteses, se tiver uma pessoa sincera à sua frente, ainda é capaz de ouvir algo do tipo: “ Não me peças isso, por favor. Sabes que gosto muito de ti, mas”... Se lhe disserem “ eu deixo isto de um dia para o outro, não sou viciado. Paro quando quiser!”, aí é que pode esquecer! O seu namorado (a) é fumador(a)!E no elevador? Nunca lhe aconteceu estar quieta(o) a um canto à espera de chegar ao andar X e alguém se lembrar, que “ ainda bem que trouxe comigo o isqueiro. Ao menos isso! “ e, em poucos segundos, a cabine está empestada de fumo, não deixando ninguém respirar ? Senão, está com muita sorte! Acredite! Pode ser paranóia minha, mas, às vezes, não lhe parece que estão a atirar o fumo de propósito para cima de si?! É como se, quem fumasse pertencesse a uma espécie de elite. Bem, só se for a do cancro de pulmão! Faz parte do Status? É estar na moda? É “in”? E o que é que significa ser “in”? É ser mais moderno do que os outros? Porquê ?Já andou de avião ? Pois é ! Uma vez, tive a infelicidade de ter de viajar na zona de fumadores. Estão a ver o filme ! Levei toda a viagem a levar com o fumo.Ainda por cima, de uma equipa de futebol ! Nada contra o futebol, pelo contrário, não é isso. Apenas fazia com que fossem logo, pelo menos, 11 pessoas. Diga-se a verdade, é muito fumo de uma só vez.Tudo isto, já para não falar em algo que nos acontece a todos, nem que seja uma vez. Estar na discoteca, ou numa festa particular, quando alguém acidentalmente lhe queima o braço ou a mão, com a ponta do cigarro. Claro, são coisas que acontecem. Somos civilizados, não é isso. Mas, a verdade é que arde e arde bem!Mesmo depois das mil e uma atenções, que se recebe logo de seguida ao pedido de desculpas cheio de embaraço, acompanhadas de um paninho com gelo para por na queimadura.Simpáticos ! Mas, arde !

Raquel Moreira
Public, "Correio dos Açores", 2004.

PRAXES: TEMPOS QUE NÃO VOLTAM MAIS

Ir para dentro do lago, levar com ovos na cabeça e cantar ao desafio, são algumas das actividades a que os calouros são sujeitos nas semanas da Praxe, já para não falar em medir, com um palito, toda a área de um edifício ou de um campo de jogos. Praticamente por todo o país, o início do ano académico é marcado por estes e outros rituais, que costumam também incluir as chamadas festas “do calouro”- para satisfação dos novatos nestas andanças universitárias, que esperavam já por momentos um pouco “diferentes”. Um mundo onde anseiam entrar, de onde anseiam sair e para onde depois desejam voltar, recordando para sempre e com carinho a camaradagem, as habituais festas, os amigos que ganharam e até mesmo as aulas e muito do que lá aprenderam, muitas vezes sem se darem conta disso.Um caminho que termina com a popular “Queima das Fitas” e muitas lágrimas nos olhos, de filhos e pais! A concretização de sonhos de uma vida inteira. Etapas que vão e que ficam! São memórias que perduram!Resta-nos viver esses tempos com “espírito académico” e poder dizer seja a quem for “Quem me dera voltar a estudar!”.
Começou mais um Ano Lectivo! Desde fins de Setembro, que as portas da Universidade dos Açores se abriram, para assistir à entrada dos alunos. Uns novos, outros nem tanto, mas todos partilham o desejo de novas experiências, de novos amigos e de tudo o que vida tem para lhes oferecer!Como não podia deixar de ser, o início do ano académico é sempre marcado pelas famosas “praxes”. Há quem as receba com um sorriso ou mesmo uma gargalhada, há quem não goste. Mas, é assim! Tudo faz parte!
Veteranos
Segundo Sérgio Simões, natural de Coimbra e actual presidente da Comissão de Veteranos da Universidade dos Açores, as praxes este ano “estão a correr muito bem. Tivemos uma boa adesão, cerca 260 calouros, mais 120 na segunda fase de candidatura”. Quanto ao programa de actividades, a quinzena do Calouro iniciou-se no Sábado passado com a recepção aos novos alunos, depois “tivemos no dia 6 a Procissão das Velas, a 9 o Baptismo e, no sábado seguinte temos o julgamento”. Já sem falar nas famosas “troops” ( de cada curso e uma mista no final ), onde se realizam os “jogos mais divertidos, como os matraquilhos humanos”. Além de que é a única actividade da praxe onde se pode praxar “fora do recinto académico”. Pelo meio, puderam ainda desfrutar de Karaoke no dia 7, realizado no Bar Académico e nos dias 8 e 9 tivemos festas na Universidade com entrada gratuita para os calouros”.As queixas dos calouros perante as praxes prendem-se mais com o “esforço físico. Eles vêm muito fraquinhos e não estão habituados a tanta flexão. Precisam de uma dietazinha e nós “tratamos-lhes da saúde”. Eles têm de ser bem tratados e nós zelamos pelo seu bem-estar físico – comenta bem disposto o presidente da Comissão.Falando na sua própria praxe, Sérgio Simões recorda que “foi muito mais “puxada” do que as deste ano. Há exageros em todos os anos, pois “há sempre quem sabe e quem não sabe praxar. Mas, eu adorei a minha praxe e há por aí calouros, que dizem estar a adorar”.Entre o que lhe disseram para fazer na sua praxe, o presidente da Comissão relembra que teve de fazer “um Striptease virtual para um poste, a ver se ele derretia e tive de praticar um acto sexual com uma salsicha como pena do meu julgamento”. Mas, comenta que foi “engraçado. O que mais gostei de fazer foram as troops, onde somos “praxados” à noite pela cidade fora”. O estudante de Coimbra defende ainda que “é onde se cria mais aquele espírito de união entre os calouros, pois eles unem-se e conhecem-se uns aos outros e aos seus próprios limites e ajudam-se entre si, tanto na praxe com na universidade. Acabamos por criar grandes amizades na praxe” – comenta Sérgio Simões com um sorriso.A praxe não é vista por todos os calouros da mesma maneira. Uns encaram-na como algo divertido, outros nem tanto. Para Sérgio Simões “tudo depende da maneira como o veterano “praxa””. Segundo o mesmo, a praxe deve ser feita como um “acto de integração do calouro”, de modo a criar união e amizade entre calouros e na relação com os veteranos também. Mas, lamenta haver sempre “alguém que exagera, acabando por haver calouros que acham que a praxe “não é nada de jeito””. Estes desistem ou “chegam ao fim da praxe com alguma raiva” e na sua vez de praxarem “vingam-se nos calouros que apanham”. Sérgio Simões defende tratar-se de um “ciclo vicioso”, daí a existência da Comissão, que tenta ao máximo “regular todas as actividades, para evitar excessos”- explica o veterano.Quem não adere às praxes sofre algumas penalizações. Apesar de não haver “grandes penalidades”. Não proíbem o uso do traje, pois este “pertence à Associação Académica” e é um “símbolo de todos os alunos da universidade”. A única desvantagem é que mesmo participando na bênção das pastas, “não podem “queimar fitas””. Uma ocasião de “tradição”, e de um “simbolismo total em que quando se acaba o curso vêm cá os “papás” ver os filhinhos queimar as fitas e “fartam-se” de chorar” – relembra Sérgio Simões.
O veterano conta ainda que são “exigidas” várias actividades aos novos alunos. Em termos de obrigações diárias, têm que “ir buscar os cafés, a comida, tirarem os tabuleiros das mesas na cantina”...Na praxe, propriamente dita, Sérgio Simões gosta de se “divertir ao mesmo tempo que o calouro”. Desde pô-los a “berrar” qualquer coisa, ou a “cantar à frente de toda a gente”. Chegaram a pôr os calouros a “fazer uma serenata às empregadas do Bar”. Também existe a praxe física, onde “fazemos perguntas e quando eles erram a resposta têm de fazer flexões”. São, normalmente, umas “vinte” de cada vez. Um pouco menos para as raparigas” – conta bem disposto o presidente da Comissão.O estudante de Coimbra revela também que tentaram este ano organizar o “jantar do calouro”, apenas com os veteranos e os calouros “que aderiram à praxe”. Mas, “é muito difícil arranjar um espaço para 200 pessoas jantarem”. Realizar o jantar na própria universidade “teria custos muito elevados” – lamenta Sérgio Simões.
No dia 8 do corrente, foram realizados “os Jogos de Praia, organizados pelos Serviços de Acção Social da Associação Académica”. Actividade “obrigatória, onde os calouros são levados para a praia e praticam um pouco de desporto, como volei, futebol, entre outras”.O presidente da Comissão chama a atenção ainda, para o facto de o único objectivo deste encontro ser o convívio. “Não vai haver praxe, apenas convívio. Além disso, as próprias faltas também são justificadas, para motivar os calouros a participarem” – explica o estudante de Coimbra.Quanto a histórias que acontecem durante as praxes, são muitas. Sérgio Simões revela a existência de “casalinhos de namorados” criados nas praxes.Um rapaz - já veterano –no seu ano de calouro apanhou “pena máxima”, dada aos calouros que “insultam os veteranos, recusam as praxes ou têm uma atitude desleixada, como era o caso”. Ele teve de ir para o lago da universidade (que é baixinho, a água dava-lhe pelos joelhos). “O calouro usava óculos e perdeu-os ao atirar-se para dentro do lago, porque escorregou” – relembra Sérgio Simões. Outra caloura, “não sabia nadar e estava aterrorizada e a gritar”- mesmo com a água pelos joelhos, por ter de estar dentro do lago!São inúmeras as histórias, que marcam o início de uma nova fase na vida dos estudantes.
Calouros
Os calouros, por sua vez, parecem estar a apreciar toda esta roda viva das praxes.“As praxes são um espectáculo”.
Segundo José Rui, “tem sido muito divertido”.Para este aluno de Biologia Marinha trata-se de “um meio de conhecermos pessoas novas”. Experiência que considera “mesmo muito estimulante”. O alentejano comenta ser “um tempo em que estamos divertidos, e não temos de nos preocupar em estudar”.José Rui, diz mesmo “as praxes são um espectáculo e estão a correr muito bem”. O calouro adianta ainda que, quando chegar à sua vez “também vou praxar”. Mas, contrapõe que esta deve ser feita “de maneira a que eles não se sintam postos de lado”. Pois, isso às vezes “acontece com alguns veteranos, mas é à parte. É um lado um pouco bizarro da praxe” - comenta.Quanto à sua vinda para os Açores, conta que “escolhi vir para aqui e era mesmo isso que eu queria”. Tanto que foi “a minha primeira opção de candidatura”. Já tinha estado cá há dois anos e achou a ilha “realmente, muito bonita. A natureza é um espectáculo”.
“Os Açores são os Açores”
André Medeiros, estudante de Biologia Marinha, veio para a região, porque “os Açores são os Açores. Não há que explicar. São estas ilhas espectaculares”.O estudante de Vila Real visitou o arquipélago já por diversas vezes e gostou.Além disso, conta que “tenho cá família e foi este o meu primeiro desejo”.Na opinião deste futuro biólogo, as praxes “têm corrido bem”. Manuel Medeiros confessa também que “estava com receio, devido a algumas histórias que ouvi, mas está a ser óptimo”.
“Tudo faz parte -Tudo é brincadeira”
Maria Irónia Tavares Rodrigues, natural de Ponta Delgada, tem gostado muito das praxes. “É muito divertido e além disso, conhecem-se imensas pessoas. As brincadeiras às vezes são um pouco esquisitas. Fazemos umas figuras, mas, tudo faz parte, tudo é brincadeira. A aluna de Psicologia afirma também que “vou praxar, só espero ser “suave” e não fazer brincadeiras estúpidas, mas não o têm feito comigo, por isso...”A actividade a que achou mais “piada” foi quando “levei com ovos na cabeça e na roupa”. A estudante de Ponta Delgada interpreta as praxes como algo “importante para a integração do aluno”. Mas, para Maria Rodrigues, estas “nunca podem ser um método de exclusão”. A futura psicóloga conta ainda, que “muitas vezes, os veteranos são um pouco exigentes” levando os calouros a sentirem-se “retraídos e excluídos”.
Tenho aderido às praxes
Por seu lado, Carolina, natural de Ponte de Lima e aluna de Medicina, afirma que as praxes “estão a ser boas”. A aluna de Medicina conta que “tenho aderido e não me têm prejudicado, mas não vou praxar muito quando for a minha vez”.Afirma ainda não ter “muito jeito”.

Raquel Moreira
Public, "Correio dos Açores", 2004.

Há Maomés e Maomés!!!

Caros leitores, infelizmente, não é por um motivo muito nobre que lhes dirijo a palavra. Isto, à excepção do simples facto de que as verdades têm que ser ditas, doa a quem doer! E foi o que resolvi fazer agora, após um período de alguma observação e consequente constatação de certas realidades menos agradáveis, que ocorrem na nossa sociedade. Sim, porque, logicamente, em altura nenhuma, o faria de ânimo leve!Indo directos ao ponto: Quem não se recorda de saborear, à luz da lua, um delicioso crepe com gelado (e tudo o mais que lhe apetecesse, obviamente!) na nossa marginal, antes de “Roma” chegar a Ponta Delgada? Pois é! Ainda no verão passado, esta era uma realidade plausível até ás 00h00!Actualmente, para mal da nossa gulodice, se não fosse o país da Lasanha a emprestar-nos, “de certa maneira”, um dos seus pontos fortes, isto já não seria possível! Sim, porque ao contrário do que acontecia há alguns meses, ainda no passado Sábado, como já aconteceu outras vezes, deparei-me novamente com um determinado estabelecimento a , um pouco antes das 23h00, “ delicadamente” desligar as luzes da sua tão agradável esplanada, para proceder ao seu encerramento. Isto, enquanto alguns estrangeiros se preparavam para lá entrar! O que não puderam fazer, pois o que mais se via eram já cadeiras e mesas empilhadas, tanto dentro como fora da loja, para além, claro, de algum cliente que, por ser um pouco mais lento, ainda lá estava terminando o seu repasto!Claro que, como todos sabemos, o mal vem de cima! Ninguém no seu perfeito juízo, trabalharia uma ou duas horas a mais, diariamente, sem receber o que lhe é devido! Enquanto, como já referi, no verão passado, eram três as pessoas a prestar um atendimento, que não levaria certamente à realização deste artigo, perante o sol de 2006 tivemos que subtrair duas! Ora, se a loja em questão, apresenta ao cliente uma variedade aliciante de guloseimas (de qualidade, isso não podemos negar. Ao mesmo tempo, tendo consciência de que nada é insubstituível!), estas estão devidamente expostas para que o cliente as adquira! Ou trata-se apenas de colorir o espaço com várias figuras apetitosas, que passando à realidade não chegam a existir, por uma pura questão de logística?!!Claro que é humanamente impossível, uma só pessoa “dar conta do recado”, como se costuma dizer: Preparar os tão famosos crepes, tratar dos pagamentos e ainda distribuir os respectivos sabores, conforme os gostos particulares de cada cliente. Tudo em horário nocturno e, ainda por cima, em época de verão, na qual o movimento no centro da cidade é muito maior, pois o clima assim o permite!Uns encerram ás 23h00, outros à 01h00 da madrugada! Fica ao vosso critério! Perguntemo-nos, se a montanha não vai a Maomé, Maomé vai à montanha? Ás vezes! Resta saber, se não haverá outros “Maomés” um pouco mais dedicados ao seu negócio e com vistas mais “largas, para “acolherem” todas as montanhas que surjam à sua frente! Quem sabe, assim, não nos tornaríamos numa Região bem mais “montanhosa” e com”Maomés” dinâmicos, sempre dispostos a receber e a mostrar, de todas as maneiras possíveis, que vieram a uma terra que vale a pena conhecer e visitar?!!Mas, enfim, a verdade é que, em questão de horários, é cada um por si e Deus por todos (ou melhor por alguns(!), pois para ganhar a lotaria há que comprar bilhete, não é verdade?! E, por vezes, nem todos estão dispostos a fazê-lo! ).Livros de reclamações? Por vexes até existem, mas serão lidos?!! Quiçá?Turismo e um maior desenvolvimento para os Açores? Penso ser um caminho muito longo a percorrer, ainda por cima enquanto existirem Maomés com pouco entusiasmo por passeios pedestres!Esperemos que “Roma” tenha vindo para ficar. Caso contrário, já não haverá crepes ao luar!

Raquel Moreira
Public in “Açoriano Oriental”, Set 2006.

Rafael Botelho: um nome a não esquecer na área do Motocross!

Sempre gostou de motas, veiculoque conduz, profissionalmente, desde os 9 anos. Actualmente, o MotoCross é já uma parteintegrante da sua vida que não pensa abandonar!Falamos de Rafael Botelho, que o troféu Fuchs Silkolene premiou com o 2º lugar, na categoria de iniciados!
AM- Nome completo
RB- Rafael Alves Botelho
AM- Fale-nos um pouco da sua vida pessoal.
RB- Nasci em Lisboa, mas vim para São Miguel muito novo e gosto de viver aqui, pois é uma ilha fantástica. Tenho 12 anos. A nível académico, passei este ano para o 7ª Ano de escolaridade. Em relação ao futuro, sou muito novo. Ainda não tenho muitas certezas, mas talvez Engenheiro Mecânico e como hobbie o MotoCross.
AM- Como entrou no mundo do MotoCross? Como surgiu a ideia?
RB- Eu era muito novo e já estava habituado. O meu pai tinha uma mota, não de Cross, mas, sim, de passeio e eu gostava de o ver. Depois aos cerca de 4/5 anos tive a minha primeira mota, uma pequenina. Entusiasmei-me muito, fiz estágios e aos 9 anos comecei a praticar competição. Aí comecei a competir a sério!
AM- O que o fascina no mundo das motas?
RB- Fascina-me, essencialmente, a liberdade de estar com um veiculo nas mãos, de ser meu. Pratico outros desportos, mas o MotoCross é um desporto que gosto muito de praticar.
AM- Esta prova exigiu muito treino?
RB- Sem dúvida. Pratico quase todos os fins de semanas, mas a competição de 10 de Setembro do Troféu Fuchs Silkolene exigiu muito de mim. Durante as férias, treinei, em média, umas duas horas por dia, durante duas semanas, pois, como em tudo, há que haver alguma preparação. Além disso, fazemo-lo com muito dedicação. Mesmo os meus colegas da escola, no inicio achavam tratar-se de um desporto maluco, mas depois de assistirem, dizem estar enganados. E têm razão. Sim, porque nós não temos conta Kilómetros, pois temos que dar saltos e contornamos obstáculos. Não é possível andar muito depressa. É sobretudo, uma questão de perícia. Muita perícia e muita técnica, agilidade e rapidez.
AM- Regra geral, quantas provas/campeonatos se realizam anualmente?
RB- O ano passado foram 4 campeonatos. Este ano temos 3, todos separados, em datas diferentes. Não podem ser perto uns dos outros, pois temos que estar em vários sítios.Temos o campeonato mais importante a nível regional que nos leva até ás ilhas do Faial e Terceira. Para o próximo ano, penso começaremos a ir também a Santa Maria. Em termos de provas realizadas fora dos Açores, há pilotos de cá que fazem representações nacionais e mesmo internacionais, muitos deles meus amigos e do mesmo escalão. Eu nunca tive essa oportunidade, mas gostaria de o fazer, para ver como é competir lá fora.
AM- E quanto ao patrocínio da Suzuki e Garça Tainha? Como surgiu?
RB- Estou muito satisfeito por, a partir de 2007, ser patrocinado pela Garça Tainha, pois é uma associação de desenvolvimento que ajuda crianças à integração das crianças no desporto (e não só) e várias pessoas com problemas. A associação, na figura do seu gestor, o Dr. Armando Pereira, constatou ser, realmente, necessário patrocinar o esta área e a oportunidade surgiu. O patrocínio ia ser lançado apenas em 2007, mas foi antecipado devido à prova marcada para o dia 8 de Outubro, na qual os pilotos nacionais do escalão de iniciados virão a São Miguel competir com os regionais. E é uma prova que, certamente, terá um maior destaque em termos de imprensa escrita, tanto dentro como fora do pais.Quanto à Suzuki, é uma marca da qual gosto muito e que tenho muito gosto em representar.
AM- Como conjuga esta actividade com os estudos?
RB- Nas férias treinava todos os dias! Agora que se inicia um novo ano lectivo, será a escola nos dias úteis e o MotoCross aos fins de semana. Assim terei de conjugar estes dois aspectos.
AM- Projectos?
RB- Espero chegar ao escalão rainha, que são a Elite, mas tudo depende também dos estudos. Se estes correrem bem!
A GARÇA TAINHA E O PATROCÍNIO PARA 2007
Armando Pereira, gestor da Associação Garça Tainha, explica que a referida associação foi fundada por pessoas das freguesias de Ponta Garça e da Ribeira das Tainhas, no âmbito de um grande projecto de “luta contra a pobreza”.“Criamos uma associação de intervenção a nível de desenvolvimento local e social e foi nesse contexto que decidimos apoiar e divulgar o desporto, neste caso concreto, o MotoCross juvenil”-explica.Lembra ainda que os jovens de hoje são “o nosso amanhã”. Dai a necessidade de os “preparar como seres humanos, como pessoas”, para que o futuro de todos tenha “mais qualidade e seja mais justo”. Aspecto, este que considera prioritário, em relação ao “ganhar” sempre tão ambicionado em qualquer desporto.O gestor da associação afirma ainda que, de momento, “o patrocínio irá apenas para o vice campeão regional, Rafael Botelho”. Por outro lado, lembra também a possibilidade da Garça Tainha mais tarde, apoiar outros jovens. Tudo isto, evidenciando que “o objectivo não é apoiar o MotoCross profissional, mas sim o amador e sempre na área juvenil, de iniciados”, pois, como volta a referir, trata-se de “preparar o futuro”.Relembra também tratar-se de uma associação sem fins lucrativos, para a qual este patrocínio será uma “mais-valia” em termos de divulgação da mesma.Quanto ás potencialidades deste desporto na Região, Armando Pereira reconhece que o MotoCross está no seu “inicio” e aproveita para salientar também a necessidade de haver mais patrocínios, sem os quais os jovens não conseguirão atingir os seus objectivos.Para contactar com a Garça Tainha, poderá fazê-lo para o telefone 296587369 ou através do endereço electrónico: associacao.garcatainha@clix.pt.

Raquel Moreira
Public in "Atlântida Magazine", November 2006.

Rui de Carvalho: um amante do teatro no palco e na plateia!

UM ACASO DO DESTINO, FÊ-LO SUBIR AO PALCO AOS 9 ANOS DE IDADE. GRAÇAS A “PALHAÇO DE MIM MESMO”, RUI DE CARVALHO VISITOU, MAIS UMA VEZ, OS AÇORES,ACOMPANHADO PELA FAMÍLIA!
AM- Nome Completo.
RC- Rui Alberto Rebelo Pires Carvalho.
AM- Fale-nos um pouco da sua história de vida.
RC- A minha vida sempre foi muito o teatro, foi a Arte que eu escolhi. Tive irmãos actores, uma irmã pianista. E, tudo isso, foi proporcionando através dos tempos a minha ligação ao teatro, que é muito grande e amorosa. Só tive que descobrir se tinha, ou não, jeito. Acho que tinha um bocadinho e cultivei-o. Hoje tenho 64 anos de vida teatral (59 como profissional e 5 como amador) e de espectador também. Foi algo que acompanhei sempre. Desde que comecei a entender, comecei a ir ao teatro e a ver espectáculos. Sou um homem que gosta de espectáculos, que gosta de ir. Além disso, sou bom público! Gosto de apreciar o trabalho dos artistas, gosto de ver os meus colegas irem bem, quanto à parte do que diz respeito ao teatro, gosto de ver dançar bem, gosto de ver tocar bem. Gosto muito e preencho muito da minha vida, com esse aspecto cultural.
AM- Já tinha vindo aos Açores?
RC- Muitas vezes. A primeira vez que vim aos Açores tinha 10 anos. Tenho 79! Já venho aqui há muitos anos. Conheço muito bem tudo isto, já trabalhei em todas as ilhas. A própria peça “Palhaço de mim mesmo” levou-nos à Terceira, ao Faial e trouxe-nos também a São Miguel, ao Teatro Ribeiragrandense.
AM- Como e quando entrou para o mundo do teatro e da televisão?
RC- A oportunidade surgiu na Covilhã, quando eu tinha perto de 9 anos. O meu pai era oficial do exército e, um dia, proporcionou-se eu entrar numa festa de beneficência e fiz um papel. Então, vi que era capaz de entrar. Foi talvez aí que surgiu uma mola, a mola que alimentou, que incrementou, que deu vida à minha carreira.
AM- Era essa a profissão que pensava seguir, quando era pequeno?
RC- Houve um período em que não sabia, mas aos 15 anos descobri que sim. Quando tinha cerca de 15/16 anos, fui para o conservatório. Deu-se um acontecimento, aliás dramático, de uma colega, uma grande actriz, que morreu. E fui encontrado por pessoas que conheceram os meus irmãos e que trabalharam com eles. Perguntaram-me se eu também queria e eu aceitei. Mas não me deixaram trabalhar sem ter o curso do conservatório. Então, fui fazendo teatro amador, porque eu gosto muito dos amadores. Penso que são muito úteis em todos os aspectos, na formação dos actores e dos espectadores. Portanto, a minha vida começa assim. Nunca tive uma distância muito grande do teatro nem das coisas do teatro.Há uma outra profissão que gostaria de ter seguido, a de médico. Já fiz várias vezes de médico e era uma profissão de que eu gostava. Tem a ver com diagnósticos, tem a ver com o conhecimento das pessoas, com o seu estado de saúde físico e mental. É verdade, as pessoas têm que evoluir mentalmente e fisicamente. Evoluem para o bem ou para o mal.
AM- Que comentários faz à sua carreira?
RC- Penso que é positiva. Não vou dizer o contrário. Mas não o é em todos os sentidos. Não sou muito infeliz, mas há algo que me impede de ser totalmente feliz. A quantidade de companhias de teatro que nós devíamos ter e não temos, alguma pobreza que temos no aspecto artístico, entre outros.A situação do teatro em Portugal não é famosa. Embora eu pense que vai melhorar. Mas não é só disso, que eu tenho pena. Lê-se pouco, há pouco teatro, há pouco bailado, há pouca música. Os escritores não têm muita hipótese de viver da escrita, que é muito pouca. Quer dizer, não é pouca. Publicam-se muitos livros e há muita gente a escrever, mas compra-se pouco. Não sei se depende do problema económico ou, se é um problema de não se ligar nenhuma à cultura. Também pode ser! Mas eu acho que o povo português tem que acordar para isso, porque se melhorar a sua parte cultural melhora como povo, muito mais, do que já brilha. Porque é um povo muito bom, tem que ser é mais interessado pelas coisas do espírito.
AM- Qual o personagem que mais gostou de interpretar até hoje? E porquê?
RC- Tenho interpretado muitos personagens, de que gosto muito, mas fiz um de que nunca me irei esquecer. Foi em “O Render dos Heróis”, uma peça do José Cardoso Pires, na qual eu fazia o cego. Essa figura tinha, para mim, um valor especial, porque era o nosso povo em cena. Um povo que via quando queria e quando não queria, não via. Era cego quando queria, mudava o cartaz que tinha à frente. “Sou cego”, “Não sou cego”. Tudo isto, no espírito da antiga guerra dos liberais e miguelistas. Vinham uns, mandavam embora outros e o povo era o prejudicado. Se vinham outros, mudava o governo, mas não mudava o povo, que era o mesmo que andava sempre para trás e para adiante, a levar nas costas. No fundo, baseava-se nisso. “O Render dos Heróis” foi uma peça que me agradou muito fazer. Aliás, tenho peças na minha vida, na minha carreira, que me deram grande prazer fazer.
AM- A sua participação em “Todo o tempo do Mundo”, visto interpretar um personagem um pouco afectado a nível psicológico, exigiu-lhe alguma preparação especial?
RC- Não. Acho que na nossa vida profissional, temos que observar as coisas. Se tivermos algumas dúvidas quanto a sintomas, à forma de estar, ou porque é que algo acontece, temos apenas que ir à procura de quem saiba, de quem nos possa dizer. Porque quando nós transmitimos um estado de espírito ou físico, temos que aprender porquê. Temos de saber. Porque é que é acontece? o que é que acontece? o que prende? um braço? O que nos faz estar com, ou fazer expressões faciais consideradas menos normais. Temos que saber a razão de tudo isto. O que é que podemos mexer e não podemos mexer. Se nós interpretarmos a personagem de um coxo e nos pusermos a correr, ninguém nos acredita, não é? Temos de fazer as coisas na média, mais ou menos parecidas. Um cego, por exemplo, não é nada fácil fazer, como deve calcular, porque nós vemos, mas os nossos olhos não podem ver a imagem, do que estamos a fazer. Essas coisas têm sempre um encanto e é a nossa fonte, são as pessoas, são os nossos semelhantes. Eu estou num comboio, por exemplo. Se encontrar uma senhora com um tique, ou outra coisa qualquer, que eu veja que me vai distrair, eu estou a olhar para essa pessoa para ver como é. Mas claro que não vou fazer tiques de mulher. Normalmente, são tiques de homem, mas há tiques de doenças dos nervos e várias demonstrações físicas que as pessoas têm, sem dar por isso, e que nós temos de captar. Estamos constantemente a observar e a nossa obrigação é essa.
AM- Como rei do teatro em Portugal, que conselhos daria a quem queira enveredar por este caminho?
RC- Coragem, muito trabalho, persistência e, sobretudo, lutar por aquilo que se quer. Tem que se lutar pelo teatro, porque se escolhermos a profissão do teatro, ser bailarino, ou qualquer outra desta natureza, temos de estar cientes de que estas implicam uma luta permanente para vencer.
AM- Se não existisse o teatro, como seria o mundo?
RC- Alguém o inventava. Nós todos representamos na rua uns com os outros, todos os dias. Acabava por haver qualquer coisa de imitativo do que fazemos na vida ou, que pusesse na vida real, algo de teatro. Como é que começaram os egípcios, os gregos, os romanos? As histórias são as mesmas, os defeitos das pessoas são os mesmos, as virtudes são as mesmas, os estados de espírito são os mesmos. Tem que haver sempre teatro.
AM- Alguma mensagem que queira deixar aos nossos leitores?
RC- Vão ao teatro, porque o nosso teatro precisa de público! O teatro, o ballet, a música, a leitura, os museus. Tudo o que seja para cultivar o espírito é a minha recomendação. Vão, vão, vão! Nós precisamos muito das pessoas para nos verem, para nos observarem, para nos criticarem.
AM- Projectos?
RC- Quando a vossa revista sair, estarei já a gravar uma novela nova. Ainda não sei qual o nome, mas as gravações começam por volta do dia 25 (de Abril). Estou no início dos trabalhos. Quanto a teatro, lá para o fim deste ano tenho outra peça.
O filho João Carvalho, o conhecido “compadre” dos Malucos do Riso, conta que estar em palco com o pai é “um pouco como gelado com chocolate quente”. Afirma ser “muito bom e terrivelmente aflitivo”, avançando ainda que se conhecem “muito bem” e sabem quando cada um se está a “emocionar” mais.Referindo-se a “Palhaço de mim mesmo”, afirma ser uma peça muito “intensa e densa”, cujo texto transmite qualquer coisa ás pessoas, obriga-as a pensar. O que considera ser também uma função do teatro. “A peça tem a ver um pouco com a redenção de um homem que, para terminar os seus dias em paz, como uma figura que todos nós admiramos como actor, quer terminar a sua vida como um palhaço. No fundo, é uma volta que à criança que todos temos dentro de nós. E ele para se redimir de todas aquelas coisas que o atormentam durante a vida ( e esta peça falava muito particularmente de algumas coisas que se passavam noutras vidas, noutras encarnações. Coisas que aconteceram na sua própria vida, enquanto novo, que não o deixam chegar ao estado kármico de palhaço), tem de se libertar de algumas coisas que tem dentro de si. Para alguns portugueses, homens que têm assistido ao espectáculo, é bastante tocante, porque foi algo que ultrapassou várias gerações em Portugal, a guerra de África. Ele para, um dia, poder morrer em paz, para que a alma repouse descansada, precisa que esta paz seja também interior, não só do corpo.É como se tivesse que acabar com os dramas da sua própria vida, para que a possa ver de uma maneira completamente alegre como um palhaço. Todos nós temos algo que nos amargura e às vezes são coisas tão simples, que, se calhar, basta nós conseguirmos conversar com alguém, libertamos esses fantasmas, numa pequena conversa. Conversa que, neste caso, é ele próprio em mais velho que se revisita, enquanto novo. Ele diz, a determinada altura: “quando eu morrer, tudo desaparece”. Não, não! “Tu é que desapareces e eu é que vou morrer”. É, no fundo, um ir buscar, como se fosse uma máquina do tempo que nos trouxesse atrás, nos permitisse ver onde estava a fonte do erro, onde esteve o momento que, em termos neurológicos ou psiquiátricos, por vezes, nos alteram uma vida inteira e conseguir remediar. Porque sou eu próprio a remediar-me a mim próprio quando mais velho. Por isso, é que o texto é um pouco, é complexo, mas é muito bonito. Isso, para quem pensa que sai sem sentir um pouco tocado de alguma coisa. Eu acho que o teatro não tem a ver só com comédia. Hoje, dá-se muita comedia no teatro. E eu sou, fundamentalmente quase só conhecido por comedia e deu-me um prazer enorme fazer este espectáculo, porque eu sinto que as pessoas estão a sentir desesperadamente lá dentro e até quase que engolem em seco. E é muito agradável e toca-nos a todos a certa altura da vida.O netoHenrique Carvalho Ferreira Marques, que também veio visitar os Açores, apesar de reconhecer ser “complicado” falar do avô, caracteriza-o como “compreensivo e porreiro”. “Dá para desabafarmos com ele. É um avô igual aos outros. Basicamente, é isso”-acrescenta.Explica ainda que, “em pequeno, ia muitas vezes ao teatro”. Agora é que já não vou tanto, porque o meu avô também já não faz tanto. Mas íamos ao teatro várias vezes e falávamos de teatro em casa”.Quanto à sua participação em “Olhos d’Água”, Henrique esclarece que, quando Rui de Carvalho estava a gravar “Todo o tempo do mundo”, ficou com “a ideia na cabeça, de que queria entrar numa novela”. Fez o casting e entrou. Afirma ter sido uma experiência “gira, mas nada de especial”, pois diz não gostar do “ambiente, não é para mim”- desabafa, revelando ainda que pretende seguir o caminho das “Artes, Desenho, à volta disso. Fazer bandas desenhadas ou Designer Gráfico”.A peça e o autor:Paulo Fernando Cabrita Mira Coelho, autor da peça e genro do actor, explica que Rui de Carvalho comentou um dia, que nunca tinha representado um palhaço, pedindo-lhe que escrevesse um texto, onde o pudesse fazer pela primeira vez. “Foi aí que nasceu a peça, com alguma dificuldade”- confessa, pois nunca tinha escrito à volta de um palhaço. “Mas foi um desafio interessante”.Quanto à história propriamente dita, Paulo Coelho afirma ter procurado qualquer elemento, que ligasse a peça a Rui de Carvalho. “Uma vez, que ele queria representar um palhaço, também era interessante que a peça, passasse por algum episódio da sua vida, que me servisse de arranque”- esclarece, avançando ainda que “algo que se passou quando ele era miúdo, tinha cerca de sete anos. Esse episódio utilizei-o logo a abrir a peça e esta foi se desenvolvendo e desabrochando à volta desta etapa da sua vida”- enfatiza.Como era importante introduzir também João de Carvalho, no “Palhaço de mim mesmo”, surgiu a ideia de fazer com que, fossem ambos “o mesmo personagem em idades diferentes e representando duas épocas diferentes de uma pessoa qualquer”.O enredo gira à volta de uma “redenção, que era necessária num confronto entre a maturidade de um idoso e os traumas e a ingenuidade, e a desistência e os medos de uma meia idade de um português, que passou pelo 25 Abril, pela guerra do Ultramar, por uma série de pequeninos ou de grandes traumas, que tiveram muita ou pouca importância na vida dele”- descreve, acrescentando que, é deste confronto que nasce a ideia de se recorrer a um palhaço, como uma figura de “grande bondade, grande beleza e grande pureza”.“O palhaço é a única figura que faz rir as crianças e que nos remete, no fundo, para aquilo que todos temos ou devíamos ter dentro de nós, uma criança”.. “Eu trouxe à baila alguns desses traumas criados por esse personagem, que passou pela guerra do Ultramar e de Angola e que teve uma série de circunstancias muito estranhas ligadas com assassinatos, com a guerra, no fundo. E tentei também ao longo de todo o texto, ir um pouco mais atrás e ligar a insegurança da guerra ( o facto de ele ter ido para a guerra, o ser castigado pela própria guerra), com qualquer coisa que se teria, eventualmente, passado com ele muitos anos antes”.O tema das reencarnações e vidas passadas também não lhe passa ao lado. “Coloquei muitos séc. antes, para dar a entender que, de facto, a vida tem um sentido, que não se resume só ao simples ‘nascer, viver e morrer’. Andamos cá por alguma coisa e com algum sentido. A ideia foi começar uma história muito atrás, verificar que essa história continua um pouco mais à frente e, acaba por ser resolvida, ou não, no acto, na actualidade da própria historia da peça. Logo, as encadeações tinham aí alguma razão de ser. Eu acredito nisso, e essa perspectiva é o que ponho de meu, na própria historia da peça.O “Palhaço de mim mesmo” está já à venda em livro, com o mesmo nome. O autor reconhece ser “raro e difícil conseguir-se editar livros de teatro, até porque têm uma venda muito restrita. São coisas muito fechadas, mas houve um editor que se interessou por isso e, felizmente, isso aconteceu”.Outra peça de Paulo Coelho, que será igualmente editada em livro e que tem estreia marcada para Novembro/Dezembro, no Teatro Experimental do Porto (TEP) é o mito de “Morgana”, na qual Rui de Carvalho interpreta o personagem Merlin. “Trata-se de uma interacção entre a figura da Morgana na corte do rei Artur e, uma série de problemas que se ligam, hoje em dia, à mulher em si”.E continua: “É como se uma mulher especifica, representante de todas as mulheres que não conseguem dar à luz, ser mães, se interrogue. “Porque razão fui feita mulher e não consigo ser mãe?”- adianta, reconhecendo ainda a existência de uma espécie de “anacronismo”, no qual Morgana é utilizada, para explicar que pode haver uma razão para isso. Razão que pode passar por “comportamentos desta personagem histórica, que num determinado contexto histórico, explica a razão daquilo tudo acontecer ali”.

Raquel Moreira
Public in "Atlantida Magazine", Maio 2006.

Santa Clara: um clube multifacetado

ALGUNS JOVENS DE FAMÍLIAS HUMILDESE O DESEJO DE VENCER, FORAM O SUFICIENTEPARA FAZER NASCER UM CLUBE TÃO ACARINHADO PELOS MICAELENSES: O SANTA CLARA!
O Clube Desportivo de Santa Clara nasceu a 31 de Janeiro de 1921, pelas mãos do Tenente José Joaquim de Sousa, António José Carreiro e João Travassos que decidiram reunir alguns rapazes de famílias humildes. Estes brincavam, nas chamadas “Pedreiras da Doca”, com a tradicional bola de trapos para distraírem os sócios, trabalhadores rudes.Como meio de financiar o clube, e sabendo não contar com a simpatia do público que via estas brincadeiras com alguma indiferença, o Tenente José de Sousa criou uma aula para ensinar os futuros desportistas, cobrando-lhes dois escudos e meio. O Dinheiro era investido na compra da bola e nos custos da equipa.Para que tenhamos uma noção das condições precárias nas quais nasceu o Santa Clara, o equipamento (tradicionalmente composto por camisola vermelha e calções brancos) eram os jogadores que traziam de casa. As primeiras camisas eram meias tingidas de vermelho, as primeiras peúgas de lã de Santa Maria e, as primeiras botas eram de couro de bezerro, com tacos de solas e tacões velhos encontrados, por vezes, no lixo perto do farol de Santa Clara.Até as primeiras bolas eram feitas com atacadores pesados, chegando a primeira bola de futebol aos Açores pelas mãos de um jesuíta do antigo Colégio Fisher.A própria sede começou por ser um quarto emprestado em Santa Clara, a que se seguiu a Escola da mesma freguesia, o Campo de São Francisco, a actual sede de Micaelense Futebol Clube e, finalmente, a sede que o clube tem hoje, na Rua Comandante Jaime de Sousa, em Ponta Delgada.Outra particularidade algo curiosa reside no facto de, durante muitos anos, a equipa ter sido constituída apenas por jogadores nascidos em Santa Clara. Os que de lá não eram, só podiam entrar para o Santa Clara casando com uma mulher desta freguesia e residindo na mesma.Apelidado primeiramente de “Santa Clara Futeball Club”, só em 1927 o Santa Clara adquiriu o nome, pelo qual é hoje conhecido.O clube ganhou em 1922 o seu primeiro campeonato distrital, organizado pela, então, Associação de Futebol de São Miguel e foi também agraciado com a medalha de Cobre da Cruz Vermelha Portuguesa, pelos serviços prestados às “Casas de Caridade” de Ponta Delgada, e com a medalha de Mérito Municipal pelos serviços à edilidade, ambas em 1999, sendo ainda considerado uma Instituição de Utilidade Pública.A maior transferência do futebol açoriano deu-se em Dezembro de 1999, quando o jogador Clayton foi vendido ao Futebol Clube do Porto por 360 mil contos, a verba mais elevada até hoje.Acontecimento que ninguém esquece e que marcou igualmente a história do clube, foi, sem dúvida, a sua subida à I Divisão na Época 1998-1999. No último jogo do campeonato da II Divisão de Honra (Santa Clara – Aves), Eurico marcou o golo decisivo, perante uma assistência recorde de 25 mil pessoas.O seu primeiro símbolo foi um leão em cima de uma bola. Só aquando da sua filiação no Sport Lisboa Benfica é que adquiriu o símbolo que ainda hoje mantém. O clube, que tem como lema “Mente Sã em Corpo São”, conta actualmente com 3760 sócios.
Paulino de Jesus PavãoPaulino Pavão é membro do Santa Clara sensivelmente há quinze anos e Presidente há cerca de seis ou oito. Como costuma dizer, “quando fazemos as coisas por paixão, é difícil contabilizá-las no aspecto temporal”. Lembra-se apenas que desde criança que é do Santa Clara, clube pelo qual nutre “uma grande paixão, e hei de sê-lo até morrer. Mas estar num cargo destes é uma tarefa muito desgastante”- confessa.A seu ver, a situação do clube, comparada à vida política e económica do país, não é “nem excelente, nem péssima”. “A crise é nacional, passa por todos e, os clubes não estão isentos”- acentua, reconhecendo que, mesmo assim, o Santa Clara pode dar-se por “feliz”, pois tem cumprido e honrado alguns compromissos prioritários. Outros estão atrasados, mas serão também honrados após a conclusão do plano de negócios que o Santa Clara já apresentou aos sócios. “E espero que isto se concretize em breve. Aí o Santa Clara ficará em muito boa situação”- revela ainda.Quanto à entrada na I Divisão, o presidente do clube regional afirma que foi sempre “um sonho dos Açores ter uma equipa nas Ligas profissionais. O Santa Clara conseguiu-o, naturalmente com um grupo de pessoas que não se pouparam a esforços e foram de uma extrema paixão e dedicação ao clube, tal como o apoio substancial do Governo Regional”. Mas reconhece não ser fácil estar numa Liga Profissional de Futebol, muito menos num clube que está numa Região como a nossa, no meio do oceano e longe dos grandes palcos de decisão do futebol.“Era um clube que não tinha grandes estruturas para permanecer na Super Liga. Estruturas estas que se vão-se construindo e triando no dia-a-dia, inseridas num processo que está sujeito a diversas oscilações, tal como acontece com outros clubes, e que temos de aceitar com naturalidade”- acrescenta.Referindo-se ás dificuldades com que se depara na administração do clube, Paulino Pavão afirma serem várias, reconhecendo ainda que “as de ordem financeira existem, mas por vezes deparo-me com aspectos ainda mais preocupantes, como quando se escolhe um bom grupo de trabalho, um bom treinador e isto não leva a nada de positivo”.O presidente do Santa Clara lembra ainda as diversas vertentes desta equipa regional, como a Formação, o Futebol Feminino, a Natação, o Ginmnico e o Hóquei Patins. “Poderíamos ter mais modalidades, mas seria necessário haver mais pessoas disponíveis para estarem à frente de cada uma delas, o que não é fácil encontrar”-lamenta.No que toca a projectos, Paulino Pavão enfatiza que “o maior e mais urgente” projecto do clube é, no momento, a construção do Centro de Treinos e Formação Desportiva.Luciano MeloPor seu lado, Luciano Melo, Presidente Adjunto (desde 2004) e Gestor de Negócios do Santa Clara, a situação financeira do clube está a “melhorar”, em função das medidas implementadas pelo plano de negócios, aprovado pelos sócios do Santa clara em Junho de 2004. “Ainda temos o passivo elevado, cerca de 13 milhões de euros, uma dívida de 11,3/4 milhões de euros, mas com os orçamentos equilibrados e com o desenvolvimento de um conjunto de projectos já em curso, pensámos que este passivo pode ser substancialmente reduzido ou até mesmo eliminado”. Aí o clube terá novamente capacidade para voltar a dispor, a nível do futebol profissional, de um orçamento “totalmente disponível” para afectar à equipa de futebol, pois a maior parte dos apoios recebidos é aplicada na redução do passivo e no serviço da dívida.A maior dificuldade do Santa Clara é, na sua opinião, “a gestão da dívida do clube”, que reconhece ser “elevada” e que lhes coloca “diariamente” processos de credores.“Os acordos com os credores, a gestão com a entidade bancária, que nos levou a uma consolidação do passivo e ao arrumar da casa a este nível, isso já foi conseguido”-revela, lembrando que os sócios também deram o seu parecer favorável em Outubro de 2005. Luciano Melo avança ainda que, no momento, dispõem de um processo de consolidação do passivo, que lhes permite “respirar bem”.“As maiores dificuldades radicam única e exclusivamente da gestão da dívida anterior a Abril de 2004”-acrescenta.Em termos de projectos, o clube dispõe de um processo na Câmara Municipal de Ponta Delgada, que se encontra já em fase final de apreciação. Trata-se de um pedido de informação prévia, para construção de algumas centenas de apartamentos, nos terrenos onde actualmente se situa o complexo desportivo de São Gonçalo.“Temos estado em conversações com o Governo Regional e com a Câmara Municipal de Ponta Delgada, para adquirirmos o respectivo terreno. Para isso, candidatamo-nos ao próximo Quadro Comunitário de Apoio, para a construção do nosso Centro de Treino e Formação Desportiva, que será patrocinado em larga escala pela Companhia de Seguros Açoriana”-explica, acentuando que o Centro “permitirá às nossas escolas, infantis, iniciados juvenis e juniores desenvolverem a sua actividade de Formação. Falamos de sete equipas, o que perfaz sensivelmente 150 atletas em prática contínua”.Segundo Luciano Melo, outro projecto do Santa Clara é a reformulação da sua publicidade, da publicidade estática e dos patrocínios, junto de uma empresa líder do mercado. “Começamos a desenhar o nosso plano de Marketing, para a próxima época desportiva, que irá contemplar algumas inovações”.Alguns retoques finais no site da equipa regional e a conclusão de um “acordo com a empresa que fornece os artigos desportivos ao Santa Clara, para comercialização dos produtos desportivos marca Santa Clara, são outros projectos do Santa Clara”- afirma, admitindo a existência de mais alguns projectos, que não sendo ainda do conhecimento dos sócios, não devem, por isso, ser divulgados.Quanto à renovação do plantel, o Gestor de Negócios do Santa Clara defende que,”enquanto a equipa não tiver definido o seu futuro na presente edição da Liga de Honra, não iremos pensar no seu reforço. Irá depender de onde nos situarmos no final da época”-esclarece, acrescentando ser algo “prematuro”, reflectir agora sobre o reforço da equipa para a próxima época.“Claro que temos sempre jogadores referenciados, para qualquer posição. Quando temos necessidade de novos jogadores, sabemos onde estão aqueles que o clube consegue adquirir. Falo de adquirir o direito económico-desportivo deste atleta a custo zero, pois o Santa Clara jamais irá adquirir, o que vulgarmente se conhece como ‘Passe’, pois não tem condições financeiras para isso”.As outras vertentes do Santa ClaraRelativamente à Formação de Futebol, Luciano Melo afirma ser uma área “muito importante” no clube, na qual o investimento foi de “mais de 75 mil euros”. O objectivo é “aumentar o montante”, mas para que isso aconteça é fundamental que o Centro de Treinos e Formação Desportiva esteja concluído. “Aí teremos boas condições de trabalho, para que possamos falar a sério de Formação Desportiva”-acentua.Segundo o Gestor de Negócios do clube, neste momento, há uma “grande colaboração de dirigentes e pais de atletas, com o coordenador e todos os treinadores” da área, que têm a seu cargo as tarefas de formação dos jovens futebolistas do clube.Referindo-se ao futuro, Luciano Melo afirma estar “convicto” de que, quando o clube puder dispor dos seus próprios relvados virtuais e sintéticos, “iremos ter uma maior capacidade para formar jogadores de qualidade, que nos possam ser úteis na equipa de futebol profissional”.O Gestor de Negócios do Santa Clara aproveita ainda a ocasião para lembrar que, “qualquer jovem com sete/oito anos pode procurar as nossas escolas e fazer parte das nossas equipas de escolas e, mais tarde, juntar-se-á aos infantis e prosseguirá o seu caminho até aos juniores. Depois, se tiver valor suficiente para competir a nível do futebol profissional, será integrado no plantel sénior. Caso isso não aconteça, há um conjunto de equipas açorianas a beneficiar da série Açores na II Divisão B, um muito bom trabalho desenvolvido nos nossos calouros da formação”- explica.No que diz respeito ao Gimnico ( que se encontra sob a gerência de um membro do clube, Luís Raposo), Luciano Melo lembra que este passou por um período de recuperação física das instalações que estavam “bastante deterioradas”, necessitando de uma remodelação bastante profunda no verão de 2005. Além disso, o Gimnico está num processo “crescente” de novos sócios e utilizadores, havendo também uma outra situação que está a ser estudada e que permitirá trabalhar na “recuperação” dos atletas e de outros cidadãos. “Estamos a procurar maximizar as receitas de uma infra-estrutura que ainda há bem pouco tempo era bastante necessitada, em todas as suas valências”- enfatiza.Quanto ao Futebol Feminino, afirma ser uma actividade de “recriação”, pela qual têm “muito carinho”. O Gestor de Negócios do Santa Clara lembra ainda que já foram campeões de São Miguel, acrescentando que o investimento nesta área é “estritamente necessário” à manutenção da equipa. “Só temos que agradecer a disponibilidade, o voluntariado que existe à volta da equipa de futebol feminino”.No que diz respeito ao Hóquei Patins, o objectivo é “manter a equipa na II Divisão Nacional”, o que admite não estar a ser fácil.Luciano Melo acrescenta ainda estar “convencido” de que, no final da época estarão novamente preparados para garantir a permanência da equipa na mesma posição, participando, no próximo ano, em mais um campeonato. Campeonato que, “para nós, é o máximo que poderemos atingir. Não temos condições para deslocar para este departamento meios financeiros capazes de sonhar com uma subida à I Divisão. Não temos esta disponibilidade”- confessa.

Raquel Moreira
Public in "Atlantida Magazine, Mar. 2006.

Hermano Mota gere as Plantações de Chá da Gorreana

A Fábrica de Chá da Gorreana constitui um ponto de paragem obrigatória para quem visita São Miguel!
Com Hermano Mota ficaremos a saber um pouco mais, sobre esta bebida tão apreciada em todo o mundo!

AM – Nome completo
HM – Hermano Estrela Athaíde Mota
AM – Como tem sido estar à frente da Fábrica da Gorreana?
HM –Às vezes é muito difícil. Já lá estou há cerca de 40 anos e claro que existem sempre bons e maus momentos. Embora toda a organização pertença à minha mulher e à minha sogra, eu também nasci numa fábrica de chá, pois foi onde o meu pai trabalhou toda a sua vida. Era um mundo que eu já conhecia. As responsabilidades é que são maiores, porque entretanto a minha sogra colocou-me o negócio nas mãos.Tenho a obrigação de fazer a fábrica ir para a frente, mas é uma tarefa que faço com agrado!
AM- Que balanço faz destes últimos tempos? Tem notado alguma diferença no volume de vendas?
HM- Temos tido altos e baixos, mas, actualmente, estamos numa altura de facilidade e de aumento de vendas. O que se deve sobretudo ao desenvolvimento turístico da nossa Região. Tal como dizia Mota Amaral, precisamos de turismo, pois não conseguimos vender o que temos.Num mercado grande, dispersamo-nos, por isso há que arranjar maneira das pessoas virem experimentar os nossos produtos, não só o chá. E felizmente isto está a acontecer. O consumo de chá aumentou extraordinariamente nos Açores e em todo o mundo. Na Alemanha, por exemplo, subiu quarenta por cento nos últimos quatro ou cinco anos, o que é importantíssimo. Ou seja, o chá voltou a ocupar uma posição de destaque que já ocupou nos anos trinta e, é este o caminho que importa seguir.Independentemente disso, veio o advento do chá verde. Temos a Procissão do Santo Cristo dos Milagres, na qual as folhas do chá são utilizadas na confecção dos famosos tapetes de flores.Além disso, o chá verde dos Açores é bastante mais fácil de beber, do que os oriundos da Ásia ou da China, o que fez com que a sua venda tenha aumentado consideravelmente. Passamos de novecentos quilos há seis ou sete anos, para dezasseis toneladas no ano passado. No ano anterior, vendemos cerca de quinze. Evitamos produzir chá em excesso, limitamo-nos apenas a aumentar um pouco a produção, em relação ao ano anterior.
AM- Que iniciativas tem desenvolvido para atrair mais turistas a visitarem a fábrica?
HM- O esforço que temos feito na área do Turismo é muito facilitado pelas agências de viagens, porque antes deste surto de turismo eram estas que nos traziam os turistas. Claro que continuamos com o mesmo tipo de relacionamento e fazemos o possível para estarmos abertos 365 dias por ano. Uma agência de viagens ao criar um circuito extraordinário ou regular tem sempre a hipótese de parar na Gorreana, que julgo ser um sítio agradável. Além disso, as pessoas saiem de Ponta Delgada por volta das nove ou dez horas. Às onze horas, as casas de banho começam a fazer falta. E temos muito prazer em receber visitas.Obviamente, passo lá a maior parte do meu tempo e acabo por falar com pessoas de todo o mundo. Muitas delas, vieram de países super desenvolvidos e higienizados onde predominam o plástico e o inox. Mas quando entram na Gorreana, acabam por apreciar o cunho da história e do passado, que queremos manter e transmitir.Procuramos manter as máquinas exactamente como estavam há setenta/oitenta anos atrás. Claro que, temos modernizado o circuito das folhas trabalhadas, mas entre comprar umas passadeiras transportadoras de aço/inox muito bonitas e brilhantes, optamos por outras não muito mais baratas, mas de há quase cinquenta anos atrás.É uma visita agradável, na qual as pessoas provam os chás e passeiam à vontade.No que toca ao turismo, estamos um pouco atrasados, mas pretendemos abrir uma sala de chá. É um dos nossos projectos.A Gorreana centraliza o acolhimento de pessoas com alguns conhecimentos e cuidados de história, de tradição. É obrigatório ir à Gorreana, porque é um motor de electricidade contínua que trabalha desde 1926, pois tem a transmissão com correias.O melhor chá é aquele de que se gosta. Por isso, o chá Gorreana vai ter sempre quem goste dele.
AM- Quais as variedades de chá de que dispõem?
HM- Temos os chás verde e preto, ambos feitos pelo sistema tradicional (ortodoxo). A diferença reside no enrolar das folhas, pois existem várias maneiras de o fazer e algumas delas penalizam um pouco o produto final. Os provadores e as pessoas entendidas em chá defendem, que quanto mais esmagadas forem as folhas, pior será nas escuridades organoléticas, sobretudo no aroma.O chá preto divide-se em quatro tipos, o Orange (muito apreciado pelos nórdicos e cuja procura tem aumentado), o Peckoe, o Brocken Leave e, o Féninx feito com as moínhas, as partículas das folhas que se vão partindo.O chá Orange está relacionado com Guilherme de Orange (séc. XVI). Os portugueses descobriram o caminho marítimo para a Índia e trouxeram o chá para a Europa. Depois foram os holandeses. Mas como defendíamos muito bem o nosso negócio, os holandeses desistiram de ir à Índia e partiram para a Indonésia, trazendo o Tea para a Europa e a classificação dos chás (o Peckoe, que significa folha).À melhor folha deram o nome da família Orange, que organizou a Companhia das Índias Ocidentais e comercializou o Tea na Europa.No chá preto separamos as três primeiras folhas do rebento, pois só estas serão utilizadas para fazer o chá.Dentro do chá verde, temos o chá no qual não enrolamos as folhas e o enrolado, que é mais bonito e bom para vender a vulso. Mas este chá acabou por ficar mais tempo exposto ao ar, sofreu mais oxidações e acabou por ser penalizado, ficando com menos oxidantes activos. O chá menos trabalhado tem um aspecto mais grosseiro, mas é o chá que mais antioxidantes tem em Portugal e é dos mais vendidos a nível nacional.Em termos de sabor, nota-se alguma diferença. O chá verde enrolado tem um pouco mais de aroma e um paladar mais suave.Já fomos os principais fornecedores oficiais de duas famosas salas de chá lisboetas que fecharam, a Bemar e a Versaille. Isto, com os chás semi-fermentados que se bebem no Sul da China. Ainda os fabricamos, mas em pequenas quantidades. É apenas para não perder o jeito. Eles fermentam sem serem oxidados.De todos estes, o que regista maior número de vendas é o chá verde. Em 2005 vendemos cerca de dezasseis toneladas de chá verde e quase catorze toneladas dos quatro tipos de chá preto. O consumo no Arquipélago dos Açores não diminuiu. Simplesmente expandimo-nos também para o mercado do continente e da Madeira.
AM- Projectos para a Fábrica?
HM- Vamos criar uma sala agradável para receber as pessoas, com alguns bolos minimamente tradicionais. Só que têm havido umas pequenas divergências com as autoridades, sobre como deve ser a sala. É uma questão de sensibilidades e de estilos diferentes, mas julgo que este ano já teremos a nossa sala de chá.Vamos também mecanizar o empacotamento de todo o chá, mesmo nos sacos de cem gramas. Já tivemos uma máquina que fazia isso, mas a quantidade acabava por nunca ser a mesma. A máquina da altura não precisava a quantidade. Hoje em dia já existe uma máquina, que dá exactamente as cem gramas pretendidas. A primeira fase do projecto dar-se-á dentro de seis meses com os famosos “tea bags” de papel de filtro. Quatro ou cinco meses depois será a vez da outra máquina. Foi um investimento de vinte três/quatro mil contos.Outro acontecimento que me deixou particularmente satisfeito, foi a proposta da Universidade de se juntar a nós, no estudo dos conteúdos dos antioxidantes nas folhas nascidas depois de Setembro. Terminamos a apanha em Setembro, limpamos as plantas e a partir de Novembro iniciamos as podas dos arbustos, de modo a criar uma superfície onde irão nascer as novas folhas, em meados de Março. São cerca de oitenta toneladas de folhas que ficam no chão. A nossa intenção é recolhermos estas folhas e extrair-lhes os antioxidantes, que tentaremos vender já desidratados. É um mercado que tem crescido muito nestes últimos anos, principalmente no que toca à indústria de cosméticos, sabonetes e champôs. Vamos investir neste mercado, com a ajuda da Universidade, personificada na figura do Professor José Baptista, um homem extraordinário a nível de colaboração.(…)”o que regista maior número devendas é o chá verde. Em 2005, vendemos cerca de dezasseis toneladas de chá verde equase catorze toneladas dos quatro tipos de chá preto”.

Raquel Moreira
Public in "Açores Mundo", Jan 2006.